Vivemos a 20 mil léguas de tudo o resto, vivemos numa ilha com todo o tipo de regalias e toda a gente dá preferência a bananas. O homem moderno português consiste em beber cerveja, mandar alguns pedaços de saliva para a televisão de vez em quando, ver a bola quando calha e anseia pela noite de Domingo para ver o que quer que seja que dá na TVI a essa hora. E porquê, e para quê? São todos empresários, políticos, economistas em qualquer café, porque toda a gente faz melhor. E aos Sábados são jogadores de futebol, também. Quando toda a gente andava a viver acima das suas possibilidades, não me lembro de alguém reclamar. Mais tarde, quando havia crise em todo o lado, não se falava de outra coisa nos Estados Unidos, e alguém lhes disse que ia correr tudo bem? Eles acreditaram. Não me venham então dizer que a culpa é do Sócrates, vão-se foder todos, a culpa é vossa, porque é fácil apontar dedos a quem governa, mas é meio palmo de distância mais difícil olhar para o interior. Quando todos os cidadãos decidiram pedir mil e um empréstimos ao mesmo tempo só porque queriam um Mercedes, não vi ninguém a reclamar. Não me venham então dizer que a culpa é dos bancos, vão-se foder todos, a culpa é vossa. E mesmo agora, agora que o país está infestado de corrupção como nunca antes, ninguém diz alguma coisa de jeito. Cantem a “Grândola Vila Morena”. Ficam com a ideia errada de que o que precisam é de relaxar, quando o que é preciso é deixarem-se de merdas de manifestações, levantarem-se mais cedo da cama no dia de folga (sim, porque esse é que é o dia sagrado), conduzirem o carro até Lisboa e insultar toda a gente que está em frente à Assembleia, começar a tirar as pedras das calçadas e começarem a desfazer ideais pré-concebidos e entrarem lá dentro com pedras também, paus, e insultar toda a gente que lá se encontra. E não é como vejo no telejornal das 8, “Seus incompetentes!”, “Não têm vergonha, corruptos!”, “Estamos entroikados!”. Não. Vão-se foder. Deixem essa mansidão de lado, e insultem-nos a sério. Quando passem por um político na rua, cuspam-lhes para os pés e chamem-lhes filhos da puta, chamem-lhes cabrões. Planeiem algo majestoso. Estou farto de ver a UGT a convocar manifestações repetitivas em que só levam é cartazes e bandeiras e megafones. Homens da Luta? Não. Ridículo. Se por acaso entrarem na Assembleia, procurem a senhora dos verdes e cortem-lhe a língua, a mulher irrita-me. Não apontem a culpa aos bancos, mas antes tomem-nos de assalto. Partam janelas. Partam parquímetros. Partam os pórticos das SCUTS. É tudo um sonho, é tudo uma ilusão. Amanhã vou acordar com o telejornal e a primeira notícia que eu vou ouvir é um bando de pardais a cantar o “Grândola Vila Morena”.